Utilizada no cultivo de alface, proposta é uma alternativa ao descarte do líquido sem tratamento diretamente no meio ambiente
A alface é uma das plantas mais estudadas em testes de toxicidade por ter rápida germinação e por ser bastante sensível a contaminantes ambientais. Del Lama utilizou-as em seus ensaios científicos: precisava saber o quanto que elas resistiriam se fossem irrigadas com a água residual de pescado sem tratamento, contendo altas concentrações de material orgânico e de microrganismos.
Os testes foram feitos com base nas concentrações de resíduos – considerando os limites máximos de duas bactérias patogênicas (coliformes e salmonela) permitidos pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) – a fim de verificar qual seria o nível mais recomendado para irrigação das sementes e das mudas. Os ensaios foram realizados com água ultrapura (tratamento controle), com efluentes bruto e tratado em diversas concentrações (25%, 50%, 75% e 100%). O efluente bruto foi coletado diretamente das etapas de produção industrial; o efluente tratado, por sua vez, teve sua origem em uma estação de tratamento pertencente à própria indústria.
Os resultados foram promissores: as sementes não sofreram nenhum prejuízo e germinaram normalmente em qualquer que fosse a proporção utilizada. Já as mudas de alface não resistiram à irrigação com água residual sem tratamento. Apresentaram significativa taxa de mortalidade aos 15 dias após a semeadura, e mortalidade drástica, aos 30 e 60 dias após a semeadura. Porém, quando foram irrigadas com o efluente tratado, o resultado mudou. Responderam melhor nas concentrações de 25% e 50%. Nos outros dois tratamentos com o efluente tratado (75% e 100%), observou-se menor crescimento vegetal.
Nas análises microbiológicas realizadas nas folhas de alface irrigadas com 25% e 50% do efluente tratado, observou-se que os resultados para a presença de bactérias (coliformes e salmonela) permaneceram dentro do limite preconizado pela legislação brasileira, o que indicaria que as hortaliças poderiam ser consumidas com segurança por seres humanos, relata o pesquisador.
Embora satisfeito com os resultados, o engenheiro faz um alerta quanto ao controle sanitário de produtos agrícolas brasileiros. Segundo o pesquisador, além de coliformes e salmonelas, que já são vistoriados pela Anvisa, existem outros microrganismos que podem causar sérios danos à saúde pública. Cita como exemplo as bactérias Shigella e Vibrio cholerae. “Os ovos desses últimos microrganismos têm alta capacidade de aderência às folhas, o que dificulta a remoção deles mesmo depois da lavagem”, diz. Como proposta, sugere a reformulação da legislação brasileira, de modo a contemplar maior número de microrganismos para fins de qualidade e consumo dos produtos comercializados.
A dissertação de mestrado Aproveitamento da água residual do processamento do pescado em irrigação foi defendida no Centro de Energia Nuclear na Agricultura (Cena) da USP, sob orientação de Marilia Oetterer.
Mais informações: e-mail felipemdellama@hotmail.com, com Felipe Morais Del Lama