A extensão dos danos à economia global causados pelo novo coronavírus COVID-19 ficou ainda mais sob foco nesta quarta-feira (4), com os economistas da ONU anunciando uma provável queda de 50 bilhões de dólares nas exportações mundiais de manufatura somente em fevereiro.
Dados econômicos preliminares analisados pela Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD), em Genebra, indicam que as medidas de contenção do vírus na China — onde o surto começou no final de dezembro — já causaram um “declínio substancial na produção” global.
Os maiores impactos devem ser sentidos por União Europeia (15,5 bilhões de dólares), Estados Unidos (5,8 bilhões de dólares) e Japão (5,2 bilhões de dólares), disse Pamela Coke-Hamilton, chefe da Divisão de Comércio Internacional e Commodities da UNCTAD.
Para economias em desenvolvimento que dependem da venda de matérias-primas, os efeitos podem ser sentidos “muito, muito intensamente”, acrescentou.
“Supondo que não seja mitigado no curto prazo, é provável que o impacto geral na economia global seja significativo em termos de uma desaceleração negativa”, afirmou.
Maior queda de índice desde 2004
Citando o índice dos gerentes de compras (PMI) do setor de manufatura na China, a economista da ONU observou que este havia caído para 37,5 — uma baixa de cerca de 20 pontos — a menor leitura desde 2004.
“Isso também se correlaciona diretamente com as exportações e também implica uma queda de 2% nas exportações globais”, disse ela, com um resultante “efeito cascata” em todo o mundo “com uma queda de 50 bilhões de dólares nas exportações”.
Como a China se tornou o principal fornecedor de produtos acabados e dos chamados produtos “intermediários” usados em inúmeras indústrias — de produtos químicos a produtos farmacêuticos e peças para câmeras digitais e indústria automobilística —, as preocupações com a interrupção de longo prazo nas cadeias de suprimentos do país têm aumentado e deixado muitas empresas em todo o mundo temerosas de que sua própria produção possa ser afetada em breve, disse a UNCTAD.
“É claro que, se o vírus continuar se espalhando e ficar fora de controle, e vermos fechamentos não apenas na China, mas também na Índia e nos Estados Unidos e em qualquer outro lugar do mundo, seria um grande problema”, disse Alessandro Nicita, da Divisão de Comércio Internacional e Commodities da UNCTAD.
“Em última análise, o impacto econômico desse vírus depende das medidas que os países adotam para conter o vírus. Portanto, a China fez um ótimo trabalho em conter o vírus, mas sacrificou um pouco a economia, pelo menos nas primeiras semanas. Então, os planos de fechamentos, restrição à circulação de pessoas, são todos necessários; mas há um efeito econômico quando você toma essas medidas.”
Além da queda nos níveis de produção, a UNCTAD também destacou uma diminuição no número de navios porta-contêineres que deixaram Xangai na primeira quinzena de fevereiro (de cerca de 300 por semana para 180), que retornaram aos níveis normais na segunda metade do mês.
“No momento, o impacto nas cadeias globais de valor já está sendo sentido e provavelmente continuará por alguns meses”, disse Coke-Hamilton. “Mas, se houver recuperação, digamos nos próximos meses, o impacto a longo prazo ou ao longo do ano será um pouco diferente e será melhor. Então, depende do que acontecer na China.”
Impulsionar a produção nacional não é uma solução rápida
Respondendo a perguntas sobre se os países podem reagir a um potencial aperto na cadeia de suprimentos mirando os fabricantes nacionais, os economistas da UNCTAD explicaram que tal medida provavelmente não seria eficaz a curto prazo.
“A China construiu uma enorme logística — logística de transporte — com portos, rotas de embarque, aviões que são capazes de transportar todos esses bens para dentro e fora da China”, explicou Nicita.
“Agora, sim, algumas indústrias podem encontrar algum tipo de fornecedor alternativo, como no México ou na Europa Oriental, mas isso exigirá ainda mais tempo, porque não apenas a produção precisa ser movida, mas também a infraestrutura relacionada à logística deve ser construída.”
Coke-Hamilton acrescentou: “foi o mesmo argumento usado quando o presidente dos EUA pensou que a imposição de certas medidas em certos países transferiria a produção de volta aos Estados Unidos. Nunca é tão fácil, porque quando as empresas se mudam e realocam, montam seus setores e estruturas de logística, é muito difícil mudar a curto prazo.”