por Folhapress
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), considerou nesta segunda (4) graves as declarações do ministro do Gabinete de Segurança Institucional, general Augusto Heleno, sobre um novo AI-5 e afirmou que o militar virou um auxiliar do radicalismo do escritor Olavo de Carvalho. A declaração de Maia foi vista por parlamentares como uma brecha para que Heleno seja convocado a prestar esclarecimentos ao plenário da Câmara, movimento articulado nos últimos dias e considerado uma possível derrota ao governo Jair Bolsonaro (PSL).
Na última quinta (31), Heleno comentou declarações do líder do PSL na Câmara, deputado Eduardo Bolsonaro (SP), de que a edição de um novo AI-5 poderia ser uma resposta a uma eventual radicalização da esquerda. O instrumento, adotado durante a ditadura militar, resultou em forte repressão, com cassação de direitos políticos e fechamento do Congresso. Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, Heleno havia dito que não tinha ouvido as declarações de Eduardo, filho do presidente Jair Bolsonaro. “Se falou, tem de estudar como vai fazer, como vai conduzir. Acho que, se houver uma coisa no padrão do Chile, é lógico que tem de fazer alguma coisa para conter. Mas até chegar a esse ponto tem um caminho longo”, afirmou.
Nesta segunda, em Jaboatão dos Guararapes (PE), Maia ressaltou haver um pedido de convocação do general na Câmara. “Acho que a frase dele foi grave. Além disso, ainda fez críticas ao Parlamento, como se o Parlamento fosse um problema para o Brasil”, disse. “É uma cabeça ideológica. Infelizmente o general Heleno, o ministro Heleno virou um auxiliar do radicalismo do Olavo. Uma pena que um general da qualidade dele tenha caminhado nesta linha.”
Olavo de Carvalho, radicado nos EUA, é o principal ideólogo do entorno presidencial: seus filhos, particularmente Eduardo e o vereador Carlos, o chamam de professor. Também estão na cota de discípulos olavistas o chanceler Ernesto Araújo e o ministro Abraham Weintraub (Educação), além de assessores como Filipe Martins (Assuntos Internacionais da Presidência).
Procurado, Heleno disse à reportagem que não tem “nada a comentar” sobre a declaração de Maia. Segundo relatos, ele foi recomendado a não responder à crítica para evitar um acirramento na relação entre Executivo e Legislativo. “Nada a declarar. Não tenho nada a comentar”, afirmou. “Não vou falar, pô”, acrescentou, diante da insistência da reportagem.
A atitude é a mesma adotada por Heleno em julho, quando foi criticado pelo vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ). Na época, o filho do presidente fez ilações sobre falha do GSI no episódio da descoberta de cocaína em um avião da comitiva presidencial. Na sexta-feira (1º), o deputado Orlando Silva (PC do B-SP) apresentou um requerimento de convocação do ministro do GSI. Segundo relatos feitos à reportagem, o movimento do parlamentar da oposição não foi isolado -tendo, inclusive, aval de aliados do presidente da Casa.
Maia indicou a pessoas próximas que pretende consultar os líderes partidários sobre a possibilidade de votar o requerimento já na sessão desta terça-feira (5). Como se trata de um pedido de convocação, se ele for aprovado pela maioria dos deputados presentes, o ministro é obrigado a comparecer ao plenário da Casa, sob pena de incorrer em crime de responsabilidade na hipótese de ausência sem justificação adequada, conforme prevê a Constituição.
O tom adotado por Maia foi interpretado no Palácio do Planalto como uma tentativa do parlamentar de se distanciar de Bolsonaro por motivações eleitorais. Segundo levantamento interno, as declarações de Eduardo e Heleno tiveram uma repercussão negativa nas redes sociais, inclusive entre eleitores bolsonaristas. Para auxiliares do presidente, o movimento de Maia, adequando-se a um discurso de centro, tem também como objetivo se aproximar do mercado financeiro, que tem reprovado o radicalismo de integrantes do governo e avaliado que ele atrapalha a tramitação da pauta econômica.
Há um outro fator. Heleno, um dos principais conselheiros de Bolsonaro, tem ficado crescentemente isolado em posições mais radicais nos últimos meses. Generais da ativa que antes o consideravam uma garantia de bom senso ante as teorias mais radicais dos bolsonaristas agora preferem manter distância do oficial de quatro estrelas da reserva. Segundo conhecidos próximos, Heleno tem se mostrado irascível na condução dos trabalhos de governo. Pressionado pela ala dita ideológica, aproximou-se taticamente dos bolsonaristas. Ele tem insistido, em postagens, na tese de que os protestos no Chile podem contaminar as ruas brasileiras, algo já dito por Eduardo e pelo presidente.
Seu principal assessor, o ex-comandante do Exército Eduardo Villas Boas, recebeu críticas entre oficiais da ativa por ter repetido no Twitter a pressão que fez no ano passado sobre o Supremo Tribunal Federal -em 2018, contra um habeas corpus a Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e agora contra a revisão da prisão em segunda instância.
Para evitar que o episódio se transforme em uma nova crise entre Legislativo e Executivo, a ordem de Bolsonaro é para que a declaração de Maia não seja rebatida publicamente, sobretudo no momento que o presidente enviará uma proposta de reforma administrativa, que já enfrenta resistência tanto na esquerda quanto na direita. O núcleo moderado do governo, formado pela cúpula militar e pela equipe econômica, considerou que o tom adotado por Maia foi, nas palavras de um auxiliar palaciano, “acima do adequado”, mas que ajuda a trazer o presidente “de volta para a realidade”.
O sentimento entre líderes no Congresso é de que a conclusão da Previdência pode ocasionar um levante dos parlamentares contra o governo. Após forte repercussão da classe política, Eduardo tornou-se alvo de representação no Conselho de Ética na Câmara por sua declaração sobre um novo AI-5. Diante das primeiras críticas, ele manteve a declaração. Na sequência, foi repreendido pelo pai e então pediu desculpas públicas. No sábado (2), Bolsonaro afirmou que uma eventual punição a Eduardo será uma perseguição política.