É importante ressaltar que o termo impressões de leitura aborda apenas uma possível interpretação do conto em questão. Portanto, nunca deve ser entendido com a explicação ou “interpretação única” do conteúdo, pois estas impressões dizem respeito aquilo que eu consigo acionar do meu conhecimento de mundo ao assistir o episódio da série: “Black Mirror”.
No episódio: “Engenharia Reversa” o outro é denominado como “as Baratas” e por conta de um implante no cérebro dos soldados, este outro é percebido pelos soldados com a feição animalesca.
“Segundo Sigmund Freud é preciso emprestar subjetividade ao outro e achar que esse outro funciona feito eu, para poder lidar com ele. Pois ao corromper essa premissa, eu entro em um estado de barbárie”. Portanto, a reação pública diante da morte do cachorro da Carrefour é um exemplo de empréstimo de subjetividade a um animal de estimação, mas se eu matar uma barata não há empréstimo de subjetividade. Então eu posso matar!
E o discurso montado com o intuito de criar razões para dizer que não havia subjetividade no outro foi, por exemplo: “o genocídio e o etnocídio cometidos contra os povos da África, da Ásia e da América Latina, considerados primitivos e atrasados e, assim, assimilados à natureza – selvagens (da Selva) e bárbaros (para os Romanos os que falam como se fossem aves)”. Além disso, o discurso do Tribunal da Santa Inquisição em atribuir a denominação de Hereges a qualquer um que professasse práticas diferentes daquelas reconhecidas como cristãs ou o discurso de alguns grupos religiosos que os LGBTT+ são seres abomináveis. Perceba que no filme: “Tropa de Elite” a personagem “Capitão Nascimento” se refere a personagem “Diogo Fraga” sempre como “maconheiro”.
No cotidiano é possível encontrar também expressões que não há empréstimo de subjetividade ao outro, como após uma agressão que se tenta justificar dizendo: “ali é uma puta!”, “ali é um traveco!, “ali é um louco!, “ali é um drogado!”, ali é um bêbado!”, “ali é um tabaréu!” etc.
Diante de toda essa problematização exposta vale deixar aqui um pensamento de Paulo Freire para a reflexão: “E esta luta somente tem sentido quando os oprimidos, ao buscar recuperar sua humanidade, que é uma forma de criá-la, não se sentem idealistamente opressores, nem se tornam, de fato, opressores dos opressores, mas restauradores da humanidade em ambos”.
Rodrigo Santana Costa é professor e escritor. Publicou a obra: “Clarecer” em verso e prosa.