PREFÁCIO DO LIVRO:
O livro do pastor Caio Fábio, A Bíblia e o Impeachment, continua tão pertinente hoje quanto o fora há quase duas décadas e meia, seja porque o país está em clima de um outro impeachment, seja porque quem ao qual o livro se destinou no início da década de 90 permanecer sendo ainda destinatário do mesmo: a igreja evangélica.
Falar em igreja evangélica (igreja como instituição, claro) nos dias de hoje não é exatamente a mesma coisa de há duas décadas e meia. Nos idos do início dos anos 80, a igreja ainda era uma recém-saída dos negros anos da ditadura militar. Nesse período, a igreja foi silente. Com raríssimas exceções, uma ou outra voz evangélica se erguera contra o regime de exceção. A igreja era apenas um componente social discreto, avesso à política, longe dos embates que diziam respeito à nação e nutria, até, uma certa simpatia com o autoritarismo por conta de sua “filosofia da ordem”. Em suma, o regime militar não perturbava e ela não perturbava o regime militar.
Quando ocorre a redemocratização do país, a igreja começa a sair da toca e percebe que tem que se colocar no mundo. Inicia-se então a propagação de um mote que grassou o meio evangélico na segunda metade da década de 80, que era o “irmão vota em irmão”. Sendo um ambiente estranho ao pensamento crítico e à politização da vida, a igreja estava desguarnecida de formulações intelectuais/espirituais para discutir esse pressuposto, especialmente os meios pentecostais que, à época, estava em outra dimensão com Paul (hoje David) Young Cho. Pouquíssimas vozes, advindas sempre das igrejas históricas, eram os ‘hereges’ que se metiam nesse tipo de assunto.
Na virada década, com as eleições para presidente, a igreja já estava no páreo político, mas ainda carente das já referidas formulações. Mas àquela altura os líderes evangélicos já tinham percebido a força eleitoreira do rebanho, especialmente depois das eleições de 88. Em 92, essa igreja, quase que maciçamente, ajudou a eleger Collor de Mello presidente. Quando este se viu em apuros, em meio a escândalos vindos a público por denúncias do próprio irmão, e foi submetido a um processo de impeachment, essa igreja política e biblicamente desguarnecida entrou em parafuso. O crente deveria ou não apoiar o impeachment? E Romanos 13, como fica? Ora, uma igreja que foi ordeira e cordeira nos anos de ditadura havia sido doutrinada o suficiente para sê-lo num regime democrático. O golpe de 64 foi mais fácil porque, além do combate ao comunismo como pretexto, não fora a igreja quem sujara as mãos. Na democracia, não. Na democracia ela não teve como se esconder.
Nesse vácuo, surge A Bíblia e o Impeachment, livro que o reverendo Caio Fábio escreveu às pressas (seis dias), em quartos de hotel, para dar uma resposta ao dilema e uma fundamentação bíblica da questão.
Quase duas décadas e meia depois, o livro continua pertinente, primeiro, pelo momento político do país (em que uma presidente se vê envolvida em novos escândalos de corrupção, politicamente fragilizada, moralmente combalida e executivamente desorientada) e, segundo, pelo mesmo destinatário que, em muitos aspectos, já não é mais o mesmo. A igreja, antes no quase anonimato, tem hoje protagonismo de sobra. Ela se emaranhou ao poder, tem uma bancada no Congresso (o ainda presidente da câmara, Eduardo Cunha, é evangélico), é detentora de cadeias de comunicação, esbanja poder econômico e já demonstrou ter grande simpatia por um Estado teocrático. Sua pertinência persiste, ainda que as questões não sejam mais as mesmas de vinte e poucos anos atrás.
Depois de pequenas revisões, que tivemos o cuidado de manter seu escopo, A Bíblia e o Impeachment continua a ser leitura imprescindível para os dias de hoje, para a hora de agora.
Boa leitura!
Dilson Cunha – Março de 2016