Especialista explica algumas chaves do problema que atinge cerca de 176 milhões de mulheres em todo o mundo
Por Carolina Garcia
A endometriose é uma doença ginecológica crônica em que ocorre uma situação anômala: a implantação e o crescimento benigno de tecido do endométrio fora do útero, dando lugar a uma reação inflamatória. As zonas afetadas com maior frequência por essa enfermidade são outras estruturas reprodutivas, geralmente os ovários, mas também podemos encontrá-la nas trompas de Falópio, na vagina e inclusive no peritônio ou no trato gastrointestinal e urinário (embora seja menos frequente). As lesões decorrentes da endometriose têm um prognóstico incerto, já que podem permanecer estáveis, progredir ou mesmo retroceder.
Embora socialmente a endometriose continue sendo uma grande desconhecida, calcula-se que atinja cerca de 176 milhões de mulheres em todo o mundo. Sabemos também que essas cifras podem estar subestimadas, pois muitas mulheres são assintomáticas e, por isso, não têm diagnóstico.
Algumas dessas mulheres só são diagnosticadas durante um processo cirúrgico abdominal por outros motivos. Os especialistas observam que o fundamental é conscientizar a mulheres e profissionais da saúde para que estejam atentos a qualquer sintoma anormal, e assim evitar que o diagnóstico seja retardado, acarretando uma piora da saúde e de vida da paciente.
A médica Isabel Sánchez Magro, diretora do Departamento Médico do laboratório Merck, dá mais informações importantes sobre a doença por ocasião do Dia Mundial da Endometriose, que foi nesta quinta-feira, 14 de março.
Pergunta. Quais são os sintomas?
Resposta. Os sintomas dessa doença são diversos e têm grandes implicações na qualidade de vida da mulher. Em geral, são mais intensos durante o período menstrual e se moderam durante a gestação e a menopausa. Os mais comuns são:
Dor pélvica (cólicas) e abdominal: trata-se de uma dor intensa, contínua e incapacitante. As mulheres que a apresentam devem estar especialmente atentas à possibilidade de terem endometriose, já que essa doença é a causa mais comum de que se desencadeie esse tipo de dor (responsável em 70% dos casos). Poderíamos dizer que é um dos sintomas com os quais a doença estreia.
Menstruações dolorosas (dismenorreia): infelizmente, as mulheres tendem a achar que é normal que a menstruação doa, mas não é assim. Se essa cólica ocorrer de maneira habitual, convém marcar consulta com o ginecologista para avaliar o estado dos ovários.
Dor durante as relações sexuais (dispareunia).
Infertilidade: é a consequência mais relevante dessa doença. Estima-se que 30% a 50% das mulheres com endometriose sejam estéreis. Nestes casos, a reprodução assistida (FIV/ICSI) é uma alternativa para quem deseja ser mãe e não consegue de maneira espontânea.
Outros sintomas não ginecológicos: hemorragias ou dor em outros lugares do organismo, como as costas.
P. Como se diagnostica?
R. Do início dos sintomas até o diagnóstico da endometriose podem passar de sete a oito anos, e inclusive se deram casos de até mais de 10 anos, e além disso existe um elevado subdiagnóstico, porque se apresenta de maneira muito variável (às vezes sem sintomas).
O sangramento muito abundante e a presença de ciclos curtos são sinais que podem ajudar no diagnóstico, assim como situações estruturais anormais que afetem a passagem correta de fluxo pela vagina. A endometriose foi associada também à menarca (ou primeira menstruação) precoce e com a menopausa tardia.
Além do comportamento da menstruação, também foram identificados outros fatores que podem desencadear endometriose, como o componente reprodutivo (parece que nunca ter engravidado pode incrementar o risco) e os fatores genéticos (foram identificados vários casos em uma mesma família).
P. Como se trata?
R. É preciso realizar um tratamento individualizado, considerando os sintomas e sua gravidade, se há um desejo de engravidar, eventuais tratamentos prévios, a idade e, claro, a localização e extensão da endometriose. O tratamento é médico, cirúrgico e, em alguns casos, psicológico. Diferentemente de outros tratamentos, neste caso não se pode trabalhar sobre a causa que desencadeia a doença, e serão perseguidos estes quatro objetivos:
Eliminar os sintomas: empregam-se analgésicos e terapia hormonal. Os tratamentos hormonais são eficazes para diminuir a dor, mas nem todas as mulheres respondem da mesma maneira. Estes fármacos reduzem os efeitos dos estrogênios sobre o endométrio localizado fora do útero, reduzindo o número de células endometriais que necessitam de estrogênios para sobreviver. Assim, esta supressão tem implicações diretas também na redução da dor.
Eliminar a endometriose visível: hoje em dia se faz principalmente por laparoscopia, o que permite diagnosticar com mais precisão e operar as lesões de maneira completa permitindo uma melhor fertilidade posterior. Para isso, são necessários também profissionais com experiência, às vezes com a colaboração multidisciplinar de ginecologistas, urologistas e cirurgiões digestivos.
Restaurar a fertilidade.
Atuar sobre a progressão da doença.
P. Pode ficar algum tipo de sequela?
R. A consequência mais grave do ponto de vista físico é a possibilidade de infertilidade, devido às lesões que a patologia produz e que ocasionam aderências nas trompas do Falópio. Em função de onde se encontre o tecido endometrial, é possível que decorram outras afecções e doenças. Por exemplo, se o afetado for o trato urinário, podem ocorrer hematúria, dor e infecções urinárias.
Entretanto, não podemos nos esquecer da perspectiva psicológica. A dor crônica que acompanha essa doença em alguns casos ocasiona sintomas depressivos e ansiedade em muitas das mulheres que a padecem. Por isso, é muito importante que o tratamento cirúrgico e médico seja complementado com técnicas que busquem diminuir o estresse derivado da enfermidade.