Em países de baixa renda, 75% das pessoas que vivem com epilepsia não recebem tratamento adequado, revelou nesta quinta-feira (20) a Organização Mundial da Saúde (OMS). Em novo relatório sobre a doença, a agência da ONU aponta que a falta de acesso à terapia pode aumentar o risco de morte prematura e condenar indivíduos com epilepsia a uma vida permeada por estigma.
“A lacuna no tratamento para a epilepsia é inaceitavelmente alta, uma vez que sabemos que 70% das pessoas com a doença podem ficar livres de crises ao terem acesso a medicamentos que podem custar apenas cinco dólares por ano e ser administrados na atenção primária de saúde”, afirma Tarun Dua, do Departamento de Saúde Mental e Abuso de Substâncias da OMS.
A epilepsia é uma das doenças neurológicas mais comuns no mundo, afetando quase 50 milhões de pessoas. É uma condição caracterizada por uma atividade elétrica anormal do cérebro — o que causa convulsões ou comportamento e sensações incomuns. A doença também pode levar à perda de consciência.
A epilepsia pode se desenvolver em pessoas de todas as idades, com um número maior de incidência entre crianças e pessoas com mais de 60 anos. A patologia tem consequências neurológicas, cognitivas, psicológicas e sociais.
Morte prematura é três vezes maior entre pessoas com epilepsia
O risco de morte prematura entre pessoas com epilepsia é até três vezes maior do que entre a população em geral. Em países de baixa e média renda, a taxa de morte prematura entre indivíduos com esse problema de saúde é significativamente maior do que nas nações de renda alta.
As razões que explicam a mortalidade prematura acentuada estão provavelmente associadas à falta de acesso aos serviços de saúde quando as convulsões são duradouras ou ocorrem sem período de recuperação. A OMS também aponta para as chamadas causas evitáveis, como afogamento, ferimentos na cabeça e queimaduras.
Aproximadamente metade das pessoas adultas com epilepsia tem pelo menos outro problema de saúde. Os mais comuns são depressão e ansiedade — 23% dos adultos com epilepsia apresentarão depressão clínica ao longo da sua vida e 20% sofrerão com ansiedade. Condições de saúde mental como essas podem piorar as convulsões e reduzir a qualidade de vida.
A agência da ONU afirma ainda que de 30 a 40% das crianças com epilepsia enfrentam dificuldades de desenvolvimento e aprendizagem.
Os dados fazem parte da publicação Epilepsy, a public health imperative (Epilepsia, um imperativo de saúde pública, em tradução para o português), elaborada pela OMS em parceria com ONGs especializadas, com o Bureau Internacional para a Epilepsia e com a Liga Internacional contra Epilepsia.
Estigma é uma constante
Na avaliação de Martin Brodie, presidente do Bureau Internacional, “o estigma associado à epilepsia é um dos principais fatores que impedem as pessoas de procurar tratamento”.
“Muitas crianças com essa condição não vão à escola e os adultos têm o trabalho, o direito de dirigir e até de se casar negados. Essas violações dos direitos humanos enfrentadas por pessoas com epilepsia precisam ter fim.”
A OMS defende que a resposta de saúde pública à doença inclua campanhas de informação pública nas escolas, nos locais de trabalho e na comunidade em geral — para reduzir o estigma — e o estabelecimento de leis para prevenir a discriminação e as violações dos direitos humanos
Tratamento na atenção primária
O relatório também mostra que, quando existe vontade política, o diagnóstico e o tratamento da epilepsia podem ser integrados com sucesso à atenção primária de saúde. Programas-piloto criados em Gana, Moçambique, Mianmar e Vietnã, como parte de uma iniciativa da OMS, levaram a um aumento considerável no acesso aos serviços para identificar e tratar a doença. Os projetos levaram tratamento para 6,5 milhões de pessoas.
“Nós sabemos como reduzir a lacuna de tratamento da epilepsia. Agora, a ação de introdução das medidas necessárias para fazer a diferença precisa ser acelerada”, enfatiza Samuel Wiebe, presidente da Liga Internacional contra Epilepsia.
“Garantir o fornecimento ininterrupto e o acesso aos medicamentos anticonvulsivantes é uma das maiores prioridades, assim como a capacitação de profissionais de saúde não especialistas que trabalham em centros de atenção primária.”
OMS: 25% dos casos de epilepsia podem ser prevenidos
Entre as causas da epilepsia, estão lesões no momento do nascimento, lesões cerebrais traumáticas, infecções cerebrais como meningite ou encefalite e acidente vascular cerebral. Estima-se que 25% dos casos dessa doença neurológica possam ser prevenidos.
Intervenções eficazes para prevenir o problema podem ser implementadas como parte de programas mais amplos de saúde pública. Entre esses programas, estão os serviços de saúde materna e neonatal, as áreas de controle de doenças transmissíveis, de prevenção de lesões e de saúde cardiovascular.
A OMS elenca uma série de medidas que podem ajudar a prevenir a epilepsia:
- Triagem de complicações na gravidez e a presença de assistentes de parto capacitados(as) para prevenir lesões no nascimento;
- Imunização contra a pneumonia e a meningite;
- Programas de controle da malária em áreas endêmicas;
- Iniciativas para reduzir lesões no trânsito, violência e quedas;
- Intervenções na saúde e na comunidade para prevenir hipertensão, diabetes, obesidade e consumo de tabaco.
OMS em prol da saúde mental
A saúde do cérebro é uma área prioritária de trabalho para a OMS, devido ao considerável número de mortes e de casos de incapacidade causados por transtornos neurológicos.
O principal mecanismos de atuação da OMS é o Mental Health Gap Action Programme (Programa de Ação para as Lacunas de Saúde Mental, em tradução livre para o português). A iniciativa treina profissionais não especializados para que possam oferecer suporte de primeira linha nas áreas de transtornos mentais, neurológicos e abuso de substâncias.
A OMS dá apoio aos seus Estados-membros para que a saúde do cérebro seja incorporada a políticas e planos relevantes de saúde pública. Com isso, países podem melhorar a gestão dos transtornos neurológicos por meio de modelos de atendimento integrados à atenção primária de saúde.
Acesse o relatório da OMS na íntegra clicando aqui.