Requerimento foi aprovado de forma simbólica ao fim da última sessão do ano
BRASÍLIA — Um dia depois de o presidente JairBolsonaro chamar de “energúmeno” o educador e filósofo Paulo Freire (1921-1997), o plenário do Senado aprovou no início da tarde desta terça-feira a realização de uma sessão especial na Casa em homenagem ao pernambucano. Já a Câmara dos Deputados aprovou uma moção de aplauso ao patrono da educação brasileira.
No Senado, o evento foi marcado para o dia 4 de maio do ano que vem, atendendo a requerimento apresentado pelo senador Weverton (PDT-MA) nesta terça. O pedido foi colocado em votação pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e aprovado de forma simbólica ao fim da última sessão do ano.
Também assinaram o requerimento os senadores Esperidião Amin (PP-SC), Lasier Martins (Podemos-RS), Randolfe Rodrigues (Rede-AP), Veneziano Vital do Rêgo (PSB-PB) e Eduardo Gomes (MDB-TO), este último líder do governo Bolsonaro no Congresso.
A moção de aplauso aprovada pelo plenário da Câmara foi uma iniciativa da bancada do PSOL, apoiada pelos líderes do bloco PP, MDB e PTB, do PT, do PL, do PSD, do PSDB, do PSB, do PDT, do DEM, do Solidariedade, do Podemos, do Cidadania, do PCdoB, do Patriota, do PV, do PP, do MDB, da maioria e da minoria.
“É fácil compreender por que Paulo Freire é estudado, amado e admirado mundo afora, passados mais de 20 anos de seu desaparecimento físico: sua prática educadora fundada na troca, no diálogo, acolhedora de todas as singularidades, é um antídoto contra paixões totalitárias”, diz um trecho do requerimento para a homenagem.
O documento destaca ainda o compromisso “de vida inteira” de Freire com a “educação emancipadora”, que prega a valorização tanto do ensino superior como da educação básica. “Seu olhar voltado para o futuro nos inspira e nos desafia. Homenageá-lo, hoje, nesta Casa, é assumir o compromisso de manter vivo seu legado e transformar em realidade os compromissos educacionais inscritos na Carta de 1988”, conclui o texto.
‘Energúmeno’
Logo após a aprovação, o senador Fabiano Contarato (Rede-ES) foi à tribuna do plenário para rebater a declaração de Bolsonaro. Na segunda-feira, o presidente criticou a TV Escola e disse que investir no canal é jogar dinheiro fora porque ninguém o assiste, mas, ao mesmo tempo, afirmou que a programação é “totalmente de esquerda” e “deseduca” o público.
Em seguida, Bolsonaro relacionou as ideias de Paulo Freire ao baixo resultado do Brasil no Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa).
— Tem muito formado aqui em cima dessa filosofia desse Paulo Freire da vida, esse energúmeno. Foi ídolo da esquerda. Olha a prova do Pisa, estamos em último lugar do mundo. Se não me engano, em matemática, ciência e português, acho que um ou dois itens, somos o último da América do Sul. Vamos esperar o que desse tipo de educação? – declarou.
O Brasil, no entanto, não ficou em último lugar na América do Sul. A Argentina ficou abaixo do Brasil por cinco pontos.
No seu discurso, Contarato disse que, se Bolsonaro fosse ao dicionário, veria que o adjetivo “energúmeno” se aplicaria melhor ao próprio.
— Energúmeno é um presidente misógino, preconceituoso, sexista, homofóbico, racista, que passa uma reforma da Previdência para aumentar a desigualdade, que só beneficia banqueiros, empresários e a União e só tem como destinatário tirar direitos dos mais pobres — declarou o senador do Espírito Santo.
O parlamentar complementou dizendo que o presidente é energúmenos por violar direitos elementares como a saúde e a educação e por não viabilizar emprego e renda.
— Agora não chame, não chame Paulo Freire, não ouse pronunciar o nome dele. Acho que o presidente tinha que limpar a boca antes de falar do nosso mestre da educação, Paulo Freire […] Ah, senhor presidente, busque o dicionário, aprenda o que é energúmeno. Tome a postura como o Presidente da República Federativa do Brasil, porque isso o senhor está longe de ser. O senhor faria muito pela nação brasileira se renunciasse — disse Contarato.
O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) falou em seguida e destacou os 35 prêmios concedidos a Paulo Freire em universidades de todo o mundo e o reconhecimento pela Unesco de sua obra. Ele afirmou ainda que Bolsonaro merece a lata do lixo da História.
— O lugar de um: o panteão dos heróis da História. O lugar de outro: a lata do lixo da História, ao que ele caminha a passos largos — declarou.