Com pouco mais de seis meses de vida, o primeiro centro de inovação do Brasil focado em cannabis quer conectar o meio acadêmico com startups, investidores e influenciar políticas públicas para fazer o setor deslanchar. A empresa abriu inscrições para seu primeiro programa de aceleração, e pretende atrair startups nacionais e de outros países.
“A indústria nacional é extremamente nova, mas está dando passos grandes e temos a expectativa de que este ano trará uma evolução significativa, por conta da recente deliberação da Anvisa [que autorizou a venda de medicamentos baseados em cannabis em dezembro] “, aponta Alex Lucena, sócio e head de inovação no The Green Hub. “Tivemos um mega avanço – 2020 não é o ano das startups [de cannabis]: é um ano histórico, de construção da indústria.”
No dia 7 de março, o TGH realiza o Cannabis Day no local onde opera, o polo de impacto social Civi-co, em São Paulo. O evento incluirá discussões sobre os aspectos comerciais e jurídicos do segmento, bem como um workshop de design thinking com empresas e pessoas interessadas no business da erva: “Como é tudo muito early stage, também estamos interessados em projetos inovadores com o potencial de virar startups”, aponta. Três dias depois, em 10 de março, também no Civi-co, a empresa fará um demo day, exclusivo para convidados, para a apresentação dos projetos selecionados.
“Segundo Lucena, a TGH espera ver modelos de negócio baseados em uma vasta gama de possibilidades, que incluem não só medicamentos, mas cosméticos, suplementos alimentares, bebidas e vestuário. O head de inovação estima que, nos próximos três anos, estas ideias devem se tornar geradores de lucro significativo. A ideia para o exercício de aceleração inicial é atrair pelo menos 10 startups. Porém, o “sonho dourado” da aceleradora é criar empresas de valuation bilionário: “Queremos unicórnios, mas precisamos de massa crítica e ter mais startups atuantes nesse segmento. Para isso, vamos criar valor e ter um trabalho muito corpo-a-corpo com elas.
Interesse internacional
Lucena estima que pelo menos 30% das empresas que passarão pela aceleradora nos próximos dois anos serão estrangeiras. A Green Hub também quer ter participações nas startups em sua rede, mas o sócio da empreitada diz que isso dependerá da necessidade de cada empresa.
“Estamos falando com startups que já tiveram rounds de investimento, então elas não precisam de dinheiro, e sim de um parceiro que abra mercado, ou que a ajude a desenvolver sua tecnologia”, ressalta. “Essa conta de velho eixo, de investir R$ 100 mil por 10% não existe para nós: vamos avaliar cada caso individualmente.”
“Queremos também ajudar empresas a pivotar: uma startup da área de educação, por exemplo, pode encaixar o tema cannabis, abrindo um oceano azul que o fundador nem estava olhando até então”, acrescenta.
A oportunidade vai além do mundo das pequenas empresas. Segundo Lucena, o centro de inovação também tem recebido abordagens de grandes players atuantes no setor em outros mercados, que querem se estabelecer no Brasil: “Temos falado com muitas empresas internacionais, não só startups, que estão interessadas no processo de abertura [do mercado de cannabis] brasileiro e nos enxergam como um parceiro local”, conta Lucena, que espera intensificar a atuação desse braço de consultoria do negócio nos próximos meses.
A The Green Hub usa benchmarks internacionais, em particular modelos em uso em países como Estados Unidos, Canadá e Israel, onde existem diversos centros de inovação focados exclusivamente em cannabis.
Estes hubs juntam empresas de diversos setores, como saúde, alimentação e bens de consumo com startups desenvolvendo propostas inovadoras, tendo a cannabis como ponto central das discussões.
No Brasil, o centro já engajou organizações como a BioMinas, que promove negócios em ciências da vida, e o Instituto D’Or, da Rede D’Or, para avançar estas temáticas. “Nossa proposta é de ser um conector das pontas do ecossistema”, diz Lucena.
Quebrando tabus
Apesar das possibilidades animadoras, existem muitos desafios com relação à cannabis no Brasil, mesmo quando não se fala no uso recreativo. O maior entrave é regulatório, e a TGH quer se posicionar como um influenciador de políticas públicas para facilitar o desenvolvimento do mercado.
“Temos a intenção de criar um instituto que seja propositivo, que traga para o governo caminhos genuinamente brasileiro e customizado para este mercado e guie o planejamento estratégico do [mercado de cannabis] no Brasil, pois não podemos simplesmente copiar o Canadá, ou os Estados Unidos”, aponta.
Segundo Lucena, a TGH acompanha de perto a movimentação em Brasília nesse sentido e quer fazer mais. Um dos motivos para isso é buscar uma redução de risco para quem quer investir no setor. “Imagine uma empresa que fazendo toda uma movimentação de investimento no mercado brasileiro e daqui a pouco as regras mudam: essa incerteza não é boa para ninguém”, ressalta.
O outro desafio é educar o público-alvo possível para produtos baseados na planta, que incluem empresas, médicos e consumidores finais. Para isso, a empresa tem um braço dedicado a educação, o Centro de Excelência em Canabidiol (CEC), que já tem uma base em Santo André (SP) e abrirá outra no Rio de Janeiro em 27 de janeiro.
“Precisamos educar a população para quebrar tabus, a classe médica para ter mais firmeza para prescrever [produtos baseados em cannabis] – quando trazemos a conversa para um nível de entendimento maior, as pessoas baixam a guarda”, diz Lucena.
“Acompanhei o nascimento da internet no Brasil e acredito que o poder de disrupção da cannabis é tão forte quanto, mas a diferença é que a cannabis já tem uma base de usuários gigantesca e estamos trazendo essa conversa, bem como o potencial de novos produtos e serviços, para um outro nível”, ressalta.
“Claro, estamos falando de geração de lucro, mas o objetivo final é que a cannabis traga uma melhor qualidade de vida para as pessoas e que, principalmente, todos tenham acesso a estas ofertas”, acrescenta. “Nesse movimento tem muita gente jogando contra mas, felizmente, o time que joga a favor é muito maior.”